Formação

EJFS: A vivência da fé na juventude

Qual será a diferença entre a vivência da Fé na infância, na juventude, na vida adulta, na velhice? Fiquei pensando… Será se há diferença entre a Fé nas várias etapas da vida?

Uma coisa é a Fé; outra coisa é a vivência da Fé. Primeiramente, precisamos compreender e entender o que é a Fé! A gente aprende que a Fé é uma virtude teologal e entendemos por virtude algo virtuoso. As teologais são três: Fé, Esperança e Caridade. Implantadas em nós por Deus, elas nos direcionam diretamente a Ele. Toda a virtude provém de Deus. Nenhum bem vem senão de Deus. Sem o Espírito Santo não fazemos o bem e nem sequer desejamos fazê-lo.

Essas três virtudes nos remetem diretamente a Deus. Elas configuram-nos a Deus e tornam-nos mais próximos Dele. Fomos criados à imagem e à semelhança de Deus.

A Fé significa eu creio. Mas em quem eu creio? Quem é Deus para mim? Deus é um ser vivo? Ou conceito? Imaginação? Energia? Quem é Deus?

Eu não preciso de provas científicas para acreditar em Deus. Eu não vejo Deus, mas eu o sinto. Eu não o vejo porque é um ser espiritual. “Criador do Céu e da Terra e de todas as coisas visíveis e invisíveis” (Credo Niceno-constantinopolitano). Sendo onipresente, está em toda parte. Se eu subir as altas montanhas, Deus ali está. Se eu descer ao mais profundo dos abismos, ali encontro Deus. Se eu me trancar no quarto escuro, Deus me enxerga. Se eu estiver mergulhado no meio de uma grande multidão, Deus não me perde de vista (conforme canta Davi no salmo 139).

Nele nós existimos, nos movemos e somos! (conforme Atos 17,28). Nós estamos mergulhados em Deus como os peixes estão mergulhados nas águas. Nós sentimos o ar. Precisamos do ar. Sem ele nós nos sufocamos! Embora eu não o veja, dessa maneira é que Deus está em toda parte.

Deus é onisciente. Sabe tudo! Nada eu posso esconder de Deus. Nada!

A palavra nem chegou à minha boca e Deus sabe a palavra que eu pensei! (Salmo 139). O Profeta Jonas tentou esconder-se de Deus. Tentou fugir de Deus. Foi enviado para Nínive, uma cidade pagã, mas ele não queria ir. Não queria profetizar o que Deus tinha pedido. E fugiu.

Será que a gente pode fugir de Deus?

Quando Deus pergunta onde Adão está, no Livro de Gênesis, não se referia a um espaço físico, mas sim teológico. Onde ele se encontrava depois do pecado?

Onde tu estás? Em que caminhos tu estás? Para onde tu estás caminhando? Deus sabe tudo. Ele é onisciente

Deus é onipotente. Deus pode tudo! Para Ele não existe o impossível. Para Deus tudo é possível. Nesse Deus nós cremos, portanto. Mas, quem é Deus?

Muito difícil definir Deus. Posso falar muitas coisas sobre Deus e suas muitas características, mas eu não falaria tudo! Eu não posso esgotar o conceito de Deus!

A Bíblia define Deus com três palavras: Deus é amor!

Quem não ama não conhece a Deus porque Deus é amor! (conforme I João 4,8)

Isso significa dizer que Deus é relação. Se Ele é amor, deve amar a alguém. Se Deus é eterno e existe desde toda a eternidade (não tem começo nem fim, uma característica sua, e ninguém o criou; antes, Ele criou tudo), a quem Deus amou quando não existiam as criaturas, o universo, o cosmo?

Talvez seja uma pergunta difícil de responder. Deus amava uma pessoa, e devia essa pessoa ser eterna como Deus. Essa Pessoa é Jesus, o Filho. Mas Jesus não nasceu em Belém de Judá há dois mil anos? E antes Jesus de nascer Ele existia?

São Marcos não fala sobre a infância de Jesus. O primeiro capítulo de Marcos já começa com a pregação de São João Batista, o Precursor.

Por que não se fala nada da infância de Jesus? Por conta que o público a que o seu Evangelho se destinava já conhecia esses detalhes. A preocupação de São Marcos era falar sobre a pregação de Jesus e seus ensinamentos.

Por sua vez, São Mateus escreveu seu Evangelho para uma comunidade cristã proveniente do judaísmo. Ele tinha uma preocupação de apresentar Jesus como o Messias que foi predito pelos Profetas. Dessa maneira, São Mateus começa com uma genealogia de Jesus. Inicia-se com Abraão. Ele é a primeira pessoa que manifesta a Fé no Deus único. Com Abraão nasce o povo escolhido de Deus. Mateus tinha a preocupação de mostrar Jesus como descendente de Abraão e filho de Davi. O Messias esperado e profetizado.

São Lucas não conheceu a Jesus. Era discípulo de São Paulo. Ele começa seu Evangelho procurando testemunhas e ministros oculares para falar de Jesus. Dessa forma, Lucas dá-nos detalhes sobre a infância de Jesus (os Magos, os Pastores e a Visitação de Maria a Santa Isabel).

Por fim, o de São João, o último a ser escrito, também não fala da infância de Jesus. Contudo, fala o que significou o nascimento de Jesus e quem é Jesus! São João começa dizendo: “no princípio era o Verbo”. O conhecimento, a razão e o ser estavam com Deus, e Verbo era o próprio Deus. Tudo foi feito por meio dele e sem Ele nada poderia existir. E o Verbo se fez carne e habitou entre nós (conforme João 1).

Jesus habitou entre nós! Jesus é coeterno com o Pai. E isso aconteceu por obra do Espírito Santo!

“O Pai é o Eterno Amante. O Filho é o Eterno Amado. E o Espírito Santo é o Eterno Amor” (Santo Agostinho).

O Espírito Santo é a personificação do amor entre o Pai e o Filho. Eis é o Mistério da Santíssima Trindade!

Não se pode falar de Fé em Deus sem termos essas noções. O que torna feliz o ser humano é amar e ser amado. Nisso consiste o ser humano e a sua configuração com Deus. Esse amor precisa ser bem compreendido, portanto.

A quem nós podemos comparar o amor de Deus? Não temos comparação. Mas o amor que mais se assemelha é o de mãe, de maneira finita. De uma mãe, uma verdadeira mãe. O filho pode ser o que for. Mas, para uma mãe, ele é o seu filho! Nunca vai deixar de ser o seu filho! Assim é o amor de Deus: amor que não busca seus próprios interesses!

Se eu não tiver amor, nada serei. O amor tudo suporta, tudo crer (conforme I Coríntios 13). O amor de Deus é ágape. Amar ao próximo como a si mesmo e fazer com o outro o que se gostaria que fosse feito consigo. Assim é Deus. Aqui está a razão de que tudo gira em torno da Fé. Tudo que fere o amor é contra o amor deste Deus.

Para falar da Fé, eu vou ler com vocês Hebreus 11,1.

A fé é a garantia dos bens que se esperam e a prova das realidades que não se veem. A fé supõe confiança cega! Como uma criança que está em cima de um muro, e o pai está embaixo. Ela salta do muro rumo aos braços do pai porque ela tem a certeza de que ele vai segurá-la. O pai não vai deixá-la cair. Isso é Fé.

Certeza daquilo que não se vê, mas se espera. Confiança total!

A Fé implica em doação e em entrega. Quando eu digo que creio em Deus e sei que Ele é eterno e que tudo volta para Ele, eu necessito entregar-me de fato a Deus. Preciso ter disciplina para ter horário de usar o celular. Se eu não fizer isso, esse celular vai atrapalhar a minha vida. Vai me impedir de rezar, estudar, conversar…

Mais sofisticado de que qualquer celular sou eu! Antes que eu nascesse e fosse gerado no ventre da minha mãe, Deus já me conhecia e eu creio nisso. Eu não nasci do nada, Deus quem me gerou do jeito que eu sou. Deus me criou para ser quem eu sou. Quanto mais eu me aproximo de Deus, mais me configuro a Ele. Ele conhece mais de mim do que eu mesmo. Deus não nos criou em série. Criou-nos singular.

Eu posso andar o mundo inteiro e não vou achar alguém igual a mim. Nem se eu tivesse o poder de ir ao futuro jamais encontrarei alguém igual a mim. Somos únicos, singulares, chamados à vida por Deus.

Se eu não confio e nem acredito neste Deus, que tem um plano para mim, e que eu devo viver de acordo com a Sua Vontade, como eu preciso de Fé?

É verdade que Deus proibiu de comer todos os frutos de todas as árvores do jardim? Deus só proibiu o fruto da árvore do bem e do mal. Esse é o Pecado das Origens, que dá origem a outros pecados. O pecado que trouxe a morte para o mundo. É por isso que Jesus se encarnou para trazer a salvação. Se em Adão todos pecaram, em Cristo todos serão reconciliados (conforme I Coríntios 15,22 e Romanos 5,12-21).

Adão desobediente, mas Cristo obediente até à morte, de cruz!

Vivência de Fé é isso. Deixar-se guiar pela Vontade de Deus, impregnada na nossa consciência, que nos faz discernir entre o bem e o mal e entre o certo e o errado. Temos um risco de ter uma concepção de Fé abstrata: de crer em Deus e saber que Deus existe. Mas isso não basta. Crer não é somente saber que Deus existe.

Deus me conhece e sabe tudo o que eu devo ou não fazer. Ele me deu a Graça da Fé de Nele confiar. Porém, devo ter um cuidado de não pensar que a Fé é um catálogo de Verdades que eu preciso crer, de dogmas e só isso. Não!

Crer não é saber que Deus existe, apenas. Mas é fazer a Vontade de Deus!

Abraão foi justificado ao oferecer Isaac em sacrifício. A Fé concorreu pelas suas obras e assim a Fé se realizou plenamente (conforme Gênesis 22). Se eu creio em Deus, eu devo viver e testemunhar a minha Fé! A Fé implica a certeza de que Deus age na história. Eu preciso crer na vitória do bem sobre o mal. Deus está acima de tudo! Mesmo que tudo conspire contra nós, o resto vai ficar (conforme Jeremias 31,1-14).

Eu preciso crer no Reino de Deus, que é como fermento na massa e como grão de mostarda, que cresce vagarosamente. Mas está vivo (conforme Mateus 13, 31-33).

A fé não se mede!

É necessário respeitar as coisas divinas! Tudo que Deus fez e reverenciar o sagrado. Todos nós somos indignos. Se só comungasse quem fosse santo e puro… Mas o mais importante da Eucaristia é o estado de Graça. Se eu creio em Deus, devo pensar em tudo que devo fazer. Não aparentar, mas viver o amor. O respeito para com o outro! Não preciso ser conivente com o pecador, mas sim amá-lo!

Isso é viver segundo a Fé!

Devo também agir com coerência. Eu vivo, mas não eu que vivo! É Cristo que vive em mim. Isso é viver a Fé! (conforme Gálatas 2,20)

 

Dom José Luiz Gomes de Vasconcelos
Bispo da Diocese de Sobral 

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